Olá caros leitores, tudo bem com vocês?
Abaixo segue um artigo na integra escrito por mim em 2009, durante a disciplina de História do Brasil Império, ministrada pelo professor Valdir Luiz Schwengber. O presente artigo vem fazer uma
analise sobre o dia 7 de setembro de 1822, considerado pelos historiadores o
dia da Independência do Brasil, mostrando como esse fato ganhou importância ao
passar do tempo, tornando-se uma das manifestações cívicas mais importantes do
calendário brasileiro e também sua influência em nossa identidade nacional. Abaixo tem a bibliografia completa para vocês lerem.
A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL: FATO QUE CONTRIBUIU PARA A FORMAÇÃO DE NOSSA
IDENTIDADE NACIONAL
A emancipação do Brasil, muitas vezes interpretada de forma
contraditória, de maneira romântica ou patriótica, sem dúvida é um daqueles
assuntos históricos que merecem nossa atenção.
O famoso
grito “Independência Ou Morte”, imortalizada em pinturas, cinema, televisão (algumas vezes mostrado de
maneira irônica ou erótica) e nos livros de História mexem profundamente com
nosso sentimento patriótico, levando todos brasileiros aquela velha pergunta,
será que realmente aquela cena as margens do rio Ipiranga aconteceu?
Nesse sentido, mesmo com os prós e contras, consideramos que a Independência
do Brasil teve um papel fundamental para a criação de nossa identidade nacional
atual.
Compreendendo que a Independência do Brasil é um
fato histórico importante para a criação da identidade patriótica,
descreveremos como aconteceu o processo de emancipação, discutindo sobre os
famosos desfiles cívicos na Semana da Pátria, comparando o fato verídico com
pinturas e filmes querem mostrar, além de relacionar ele com a realidade atual,
respondendo a seguinte pergunta: Qual a influência da independência brasileira
para a formação de nossa identidade nacional?
Anos após a chegada ao Brasil, a Família Real portuguesa pensava que
tinha livrado-se de todos os seus problemas, inclusive de Napoleão Bonaparte,
tudo iria ser tranqüilo, bela ilusão. Mesmo com o fim das Guerras Napoleônicas,
a Europa foi novamente agitada, devido
às revoluções liberais.
Para piorar a situação de Portugal, em 1820, inicia-se a Revolução
Liberal do Porto. Segundo Almeida da Silva (1995, p. 9), “a vitória da
revolução liberal foi saudada com entusiasmo pelos brasileiros, e nas
províncias logo foram eleitos deputados que iriam representar o Brasil nas
Cortes”. A situação da Família Real ficou ainda mais complicada, que já estava
preocupada com a onda de Independências na América Espanhola, lideradas por San
Martín e Simon Bolívar.
Nesse contexto, em 1821,a Corte de Dom João VI teve que voltar as pressas
para Portugal, tentar resolver os problemas relacionados à Revolução do Porto,
deixando em seu lugar o príncipe regente, Dom Pedro. A seguir, as Cortes
subordinaram todas as províncias brasileiras ao comando direto de Lisboa,
fechando órgãos públicos brasileiros, favorecendo somente os comerciantes
portugueses, além de fazer pressão para o príncipe regente voltar a Europa. Com
essa política, as Cortes pretendiam recolonizar o Brasil, piorando ainda mais a
situação daqui.
Esse fato foi decisivo para iniciar uma satisfação popular em relação a
Corte portuguesa. Segundo Salles Oliveira (2005, p.11), “em decorrência da
Revolução do Porto, evidenciaram-se incompatibilidades entre os interesses dos
‘portugueses’ de ambos os lados do Atlântico, o que teria ensejado o
reajustamento das pretensões de grupos políticos enraizados no centro-sul, que
se voltaram para a opção separatista tendo à frente D. Pedro”.
Logicamente, deixar Dom Pedro no Brasil foi uma jogada inteligentíssima
de Dom João VI, pois assim manteria a monarquia na antiga colônia e, ao
mesmo, viabilizar a continuidade da
dinastia de Bragança à frente do governo em uma eventual declaração de
independência, a qual o rei tinha certeza, que mais cedo ou mais tarde iria
acontecer.
Ao mesmo tempo, muitas revoltas eclodem de norte a sul, dividindo o país
em dois partidos, o Partido Português e o Partido Brasileiro, o primeiro
defendia logicamente os interesses de Lisboa,o segundo defendia a independência
e uma união entre Brasil e Portugal, como nações amigas. Devido às pressões de
vários setores, Dom Pedro optou pela
independência. Mesmo assim, as pressões
e decretos das Cortes de Lisboa continuavam ferozes, revoltando a população
brasileira cada vez mais.
Vendo que Lisboa exigia incansavelmente o retorno imediato do príncipe
regente a Europa, vários setores brasileiros organizaram uma campanha para
coletar assinaturas a favor da permanência de Dom Pedro no Brasil, conseguindo
8 mil assinaturas, número expressivo para época, sendo entregue ao príncipe no
dia 29 de dezembro de 1821, pelo presidente da Câmara Municipal do Rio de
Janeiro, Clemente Pereira.
A resposta de Dom Pedro aconteceu no dia 9 de janeiro de 1822, expressado
em sua celebre frase “Como é para o bem de todos e felicidade geral da Nação,
estou pronto: diga ao povo que fico”. Com esse episódio conhecido como “O Dia
Do Fico” , o príncipe regente entrava em rota de colisão com Lisboa, agora a
independência seria uma questão de tempo.
Não demorou muito, a reação do Partido Português foi estacionar as tropas
portuguesas no Rio de Janeiro, comandadas pelo general Avilez, que exigiam
obediência de Dom Pedro às ordens das Cortes. No confronto que se seguiu,
Avilez foi vencido e expulso do Brasil com suas tropas.
José Bonifácio, um dos ministros de Dom Pedro, convocou em fevereiro o Conselho
dos Procuradores das Províncias do Brasil, no intuito de assessorar o
príncipe regente, além é claro estabelecer uma ligação política entre o Rio de
Janeiro e as outras províncias, procurando garantir a unidade territorial.
Em maio, foi decretado que nenhuma ordem das Cortes seria aceita sem o
“cumpra-se” do príncipe regente. No mês seguinte, o cenário político foi
novamente tumultuado, devido às divergências dos partidários de José Bonifácio
e os de Gonçalves Ledo quanto a convocação de uma Assembléia Constituinte, cujo
objetivo era elaborar uma Constituição para o Brasil.
Gonçalves Ledo conseguiu mobilizar a opinião pública e a imprensa em
defesa da convocação. Novamente pressionado, levou Dom Pedro a aprovar a
iniciativa, e a Assembléia foi convocada. Nesse mesmo instante, inicia-se uma
onda de revoltas de norte a sul, dando ínicio as chamadas guerras de independência.
No final de julho, Dom Pedro viajou a província de São Paulo, tentar
acalmar uma rebelião contra José Bonifácio. Ao retornar de Santos, próximos da
capital paulistas, às margens do riacho do Ipiranga, chegaram os últimos decretos das Cortes de Lisboa.
Como não poderia deixar de ser, eram ordens severas, um delas era que anulasse
a convocação do Conselho dos Procuradores.
Na mesma ocasião, também recebeu duas cartas pessoais, uma de seu
ministro José Bonifácio e outra de sua esposa, Dona Leopoldina, que
aconselhavam dom Pedro a romper definitivamente com Portugal, a alternativa que
restava no momento era proclamar a independência.
Nesse contexto, Dom Pedro, irritado com as ordens de Lisboa, decide
finalmente proclamar a Independência do Brasil, no dia 7 de setembro de 1822,
no mesmo local aonde recebeu as cartas. Segundo a historiografia oficial, as
margens do Ipiranga, o príncipe regente levantou sua espada e gritou “Independência
Ou Morte”, libertando-nos do domínio de Portugal. No mês de dezembro, D.
Pedro foi declarado Imperador.
Após esse fato, a independência se consolidou com relativa rapidez, com
apoio econômico e diplomático da Inglaterra, enviando mercenários ingleses a
favor de Dom Pedro nas lutas, que duraram até novembro de 1823. Daí nascia à
nação que conhecemos como Brasil.
Depois de consolidada, o Brasil buscou reconhecimento de sua
independência a outras nações. As primeiras a reconhecerem foram à Argentina,
México e Estados Unidos, depois Inglaterra e por último Portugal, no dia 29 de
agosto de 1825.
Ao contrário de que muitos historiadores pensam, a independência não teve
a repercussão na data que ela ocorreu. Segundo Salles Oliveira (2005, p. 13),
“Tampouco o dia 07 de setembro foi interpretado naquela ocasião como divisor de
águas do processo histórico em curso”.
Já a situação social tampouco mudou com o 7 de setembro, a escravidão não
foi abolida, quem era pobre continuou pobre e as desigualdades sociais
proliferavam em todos cantos . Muitos cronistas estrangeiros que viajam pelo
Brasil na época relataram com crueza essa realidade. Segundo Saint-Hilaire
(1974, p. 94), “o povo nada ganhou absolutamente com a mudança operada. A
maioria dos franceses lucrou com a Revolução que suprimiu privilégios e
direitos auferidos por uma casta favorecida. Aqui, lei alguma consagrava a
desigualdade, todos os abusos eram resultado do interesse e dos caprichos dos
poderosos e dos funcionários. Mas são estes homens, que no Brasil, foram os
cabeças da revolução”.
Até 1860, a
data 07 de setembro não significava nada
para o Império, nem o próprio dom Pedro I fazia menção a esse acontecimento em
cartas que escreveu ao pai e ao povo paulista, praticamente no mesmo período.
Durante o reinado de Dom Pedro II, essa data foi reconhecida, tornando-se feriado
nacional, foram realizados desfiles cívicos para comemorar a data e também
feitos monumentos no local aonde tudo aconteceu, onde hoje se encontra o Museu
do Ipiranga, inaugurado em 1895, quando o Brasil já era um país republicano.
Com a inauguração do museu, o público brasileiro pode ver a famosa tela
de Pedro Américo, “Independência Ou Morte”, o qual retratava a famosa
cena do Grito da Independência, nas margens do riacho Ipiranga.
Inspirado nos relatos de pessoas que presenciaram o acontecimento, inclusive
na crônica de Padre Belchior Pinheiro Ferreira e nos relatos do Tenente Canto e
Mello e do Coronel Marcondes, integrantes da comitiva de Dom Pedro na época,
criou uma obra, segundo Salles Oliveira (2005, p.59), “de fácil e prazerosa
leitura, a narrativa de Pedro Américo instiga a reflexão não só em termos da
interpretação sobre a Independência que expôs como em termos das práticas de
investigação adotadas para realizara transposição da ‘verdade’ e de situações
verossímeis, contidas nos registros escritos e orais que compilou, em imagens
capaz de aprisionar o olhar e sensibilidade do espectador”.
Já em 1972, o diretor Carlos Coimbra realiza um filme épico chamado “Independência
Ou Morte”, é uma das produções cinematográficas mais caras feitas no Brasil,
perdendo apenas para “Olga”. Com um elenco cheio de astros da televisão
como Tarcísio Meira e Glória Menezes, figurino caro e uma maravilhosa mistura
de aventura com História forma os ingredientes para ser um sucesso de
bilheteria na época. Esse filme tem como fonte de inspiração a historiografia
oficial e em telas de grandes artistas brasileiros como Pedro Américo, em
especial na cena em que retrata o momento da independência. Mesmo com todo
aquele discurso ufanista do regime militar, merece ser assistido e analisado.
O tema emancipação também já foi retratado em diversas novelas e seriados
na televisão brasileira, algumas vezes com destaque, outras como pano de fundo.
Um dos exemplos mais claros foi a minissérie “O Quinto Dos Infernos”,
dirigida por Carlos Lombardi e exibida em 2002 pela Rede Globo. Retratou os
bastidores da Independência de maneira cômica, com muita aventura e doses de
erotismo, causando muitas polêmicas em vários setores, inclusive aos
historiadores, mesmo assim foi um sucesso de audiência na época que foi
exibida.
Os desfiles cívicos, muito tradicionais nessa época, ganham destaque na
televisão e nos jornais em todo Brasil. Ultimamente , muitas entidades, em
especial as da educação, vivem uma crise de identidade patriótica, e muitas das
pessoas recusam-se a desfilar, inclusive as crianças e jovens, achando que é
“coisa pra velho” ou simplesmente “não é mais tempo de ditadura militar”.
Ano passado, segundo o artigo
escrito por Pereira (2008, p.3), “as escolas tiveram que obrigar os alunos a
desfilarem, prometendo aumento de notas ou pontos para ganhar uma gincana, isso
é absurdo demais”. A situação descrita aconteceu no município de Santa Rosa do
Sul, Santa Catarina.
Mesmo assim, a Independência foi um fato que marcou profundamente, mesmo
que seja tardiamente, a formação de nosso país como vemos hoje, ou em outras
palavras, nossa identidade nacional.
Controvérsias e ufanismos à parte, a emancipação do Brasil foi um fato
importante na história imperial, com a Independência deixamos de ser meramente
uma colônia para sermos uma nação. A memória às vezes de nós brasileiros é
curta, mas cabe a ela conscientizar nossos alunos a terem amor a pátria e não
sejam vítimas de idéias alienantes. Conforme Le Goff (1996, p. 447), “a
memória, onde cresce a história, que por sua vez alimenta, procura salvar o
passado para servir o presente e o futuro. Devemos trabalhar de forma a que a
memória coletiva sirva para a libertação e não para a servidão dos homens”.
Como podemos perceber ao fazer este estudo, o Brasil demorou um pouco
para perceber o significado daquele dia 7 de setembro de 1822, e até hoje ainda
existem pessoas que não compreendem essa data. Acreditam ser mais um feriado
como qualquer outro, aonde acontece festas, desfiles cívicos e se canta hinos
em praticamente todas as cidades do país e consideram uma tremenda “perca de
tempo” assistir ou participar.
Mas é importante que nós jovens devamos compreender que essa data não é
somente um “feriado qualquer”, que serve apenas para descansar e passear, mas
para refletirmos sobre nosso país, como ele nasceu e cresceu no decorrer da
História, criando um sentimento patriótico.
Sabemos que existem diversas invenções mentirosas embutidas na
Independência, mas devemos aproveitar disso para aprendermos muitas coisas,
pois verdades e mentiras estão sempre no meio na História da Humanidade.
Aprendemos ao longo dessa pesquisa a valorizar a história nacional, a
discutir criticamente o verdadeiro sentido dos fatos, conhecemos um pouco mais
sobre o processo de Independência do Brasil, e também aprendemos a amar cada
vez mais nosso país, enfim, os objetivos que planejamos desde o início,
acabaram sendo satisfatoriamente alcançados.
Gostaríamos de sugerir aos estudantes e pesquisadores que façam mais
estudos e pesquisas aprofundadas e interdisciplinares sobre esse assunto.
Também, a novas gerações, tão acostumadas com tantas novidades tecnológicas,
que aprendam a valorizar a identidade de nosso país e que despertem o gosto
pela História do Brasil, pois ela não pertence somente aos grandes imperadores,
militares, burgueses, poetas ou sonhadores, mas sim a todas as pessoas que
compõem o povo brasileiro, ou seja, nós.
REFERÊNCIAS:
SALLES OLIVEIRA, Cecília Helena de . 7 de setembro de 1822: A Independência do Brasil. 1. ed. São Paulo:
Editora Lazuli, 2005.
PEREIRA, Andrio Cardoso . A independência do Brasil. Extremo Sul Notícias, Santa Rosa
do Sul, n° 32, pg. 3, set. 2008.
INDEPENDÊNCIA OU MORTE. Direção: Carlos Coimbra (dir).
Brasil: Vídeo Arte, 1972. 1
filme (108 min.), son., col.
ALMEIDA
DA SILVA, Arlenice. As Guerras da
Independencia. 1 ed. São Paulo: Editora Ática, 1995.
GOFF, Jacques. História e memória. 4. ed. São Paulo:
Editora da Unicamp, 1996.
SAINT-HILAIRE, Auguste de. Segunda viagem do Rio de Janeiro a Minas Gerais e a São Paulo (1822). Belo
Horizonte/São Paulo, Itatiaia/Edusp, 1974.
Um grande abraço, bom fim de semana, até a próxima.
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